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O que é o Sandbox Regulatório da ANS?

ANS consegue na justiça liminar para manter Sandbox regulatório para novos planos com coberturas somente para consultas ou exames.
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Recentemente, o noticiário foi tomado pela notícia de que a Agencia Nacional de Saúde Suplementar – ANS, autarquia federal responsável pela regulação da área de planos de saúde privados no Brasil, pretende propor a implementação de um ambiente regulatório experimental (sandbox regulatório) para testar um produto com cobertura para consultas estritamente eletivas e exames.

Sim, você leu corretamente, a ANS que liberar um plano de saúde somente para cobertura de consultas ou seja, se você precisar de um atendimento de urgência ou emergência, o plano de saúde não será obrigado a custeá-lo.

Essa notícia cai como uma bomba, tendo em vista que o mercado de saúde privada há décadas vem sofrendo com diversas decisões da ANS que somente favorecem planos e operadoras de saúde.

Para exemplificar, vejam que as grandes operadoras (Bradesco, AMIL, Porto Seguro e Sul América) já não comercializam produtos individuais, sendo certo que somente é possível contratar os famosos “coletivos” (falsos), os quais os reajustes por exemplo, não obedecem índices de reajustes anuais da ANS, mas sim às determinações das operadoras.

E diante de um mercado em que dia após dia planos de saúde se encontram mais caros, os serviços decaem, os prazos para liberação de exames e procedimentos só fica mais longo ou seja, o consumidor é massacrado pela burocracia e reajustes abusivos, agora temos mais essa, um plano de saúde só para consultas!

Como Funcionará o Plano de Saúde só para Consultas e Exames:

O tema já atraiu muita polêmica e inclusive já há decisão judicial que favorece a ANS no caso e se aprovado, na prática, o projeto propõe que os reajustes de planos de saúde deixem de ser limitados pela ANS. Cada operadora apresentaria sua variação de custos para análise e autorização da agência. Além disso, querem ampliar os tipos de contratos — uma “modulação de produtos”.

Isso permitiria contratar módulos separados, como só consultas, apenas exames, terapias (como tratamentos oncológicos) e um módulo hospitalar, que seria o único com direito a atendimento emergencial.

Mais detalhes sobre essa nova modalidade de Plano de Saude

 Quem tiver plano só de consulta, vai ter que pagar pelos exames ou recorrer ao SUS. Já quem tem um conjugado de consultas e exames, mas não o de terapia e descobrir um câncer, também terá que se tratar no serviço público.

E em todos esses casos, quem não contratou o pacote de hospital, se quebrar um braço, vai para o hospital público ou paga pelo atendimento.

Nossas Considerações

Em nossa visão, trata-se de um grande retrocesso na área de saúde suplementar, inclusive, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, proferiu decisão judicial que valida a continuidade do Sandbox Regulatório objeto da consulta pública nº 151, bem como reconhece a conformidade jurídica da Resolução Normativa ANS nº 621/2024, que cuida do tema no âmbito da ANS.

A decisão proferida pelo Juízo da 19ª Vara Federal de São Paulo, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, reconhece, em juízo preliminar, a legalidade e a conformidade jurídica dos atos praticados pela ANS a respeito do SANDBOX regulatório, permitindo que o debate público em torno da iniciativa prossiga.

E ainda, a decisão não acatou pedido de suspensão da resolução e consulta pública e, portanto, em sede preliminar, a justiça entende que não houve qualquer irregularidade. O processo judicial prosseguirá com manifestação dos interessados para posterior julgamento de mérito, porém a decisão em si já causa grande preocupação.

A Agência alega que  “(…) a ANS reforça a importância do prosseguimento dos debates acerca da iniciativa de oferecer, em ambiente experimental controlado, um produto que caiba no orçamento dos milhões de consumidores que atualmente contam com produtos e serviços de saúde suplementar sem qualquer supervisão estatal, sendo certo que, na linha do que já foi esclarecido diversas vezes pela ANS, tal proposta em nada alterará a regulação dos planos de saúde tradicionais.”

Mas não acreditamos nisso nem por um segundo!

A proposta da ANS já foi criticada por diversas entidades que defendem o direito dos consumidores e também pelo Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação (Sinagências).

Em encontro virtual realizado no SINAGÊNCIAS no dia 25/04/2025, o Presidente Fabio Rosa pondera que: “(…) a proposta compromete a segurança dos consumidores ao permitir a comercialização de planos de saúde sem garantias mínimas de atendimento a pessoas em situações críticas de saúde, o que poderá levar a uma exposição negativa da própria ANS e de seus servidores, que serão cobrados pela sociedade para dar explicações sobre o não funcionamento desses planos no futuro. “Pode ter certeza que os servidores não coadunam com práticas que prejudicam a população e comprometem a imagem da agência”, afirmou.

Além disso, o presidente do Sinagências sugeriu alternativas regulatórias que garantam o acesso à saúde suplementar sem comprometer a segurança dos consumidores. Entre as propostas está a necessidade de uma proposição de política pública liderada pelo Ministério da Saúde, em conjunto com outros ministérios e entidades representativas da sociedade civil, para discutir alternativas que ampliem a proteção dos contratos firmados por pessoas físicas, empresários individuais, pequenas e médias empresas e trabalhadores informais, que geralmente não possuem poder de barganha para negociar com as operadoras de planos de saúde.

Essa sim é uma pauta a qual a ANS deveria se preocupar. Milhões de pessoas são obrigadas a constituir um CNPJ para conseguir contratar um plano de saúde coletivo empresarial com operadoras de saúde, as quais não aceitam ou não se sujeitam às contratações individuais e suprimem qualquer tipo de negociação por parte dos consumidores. Em verdade, aceitamos as condições de tais mega corporações de saúde ou ficamos sem plano de saúde.

Outra proposta apresentada pelo Sinagências foi a necessidade de se revisitar a Lei nº 9.656/1998, em vigor há mais de 25 anos, para que o Legislativo discuta a obrigatoriedade de oferta de produtos ambulatoriais por todas as operadoras do setor, assegurando igualdade de proteção entre contratantes individuais, familiares e empresários individuais/PMEs.

O Sinagências também defendeu a evolução na regulamentação dos planos de saúde para permitir que a ANS controle a precificação e os reajustes dos contratos coletivos firmados por empresários individuais e PMEs, eliminando a prática de seleção de riscos através da elevação de preços registrados de forma descolada dos valores ofertados para grandes contratantes coletivos. Essa mudança, segundo o sindicato, traria maior equidade na oferta de planos de saúde e evitaria práticas abusivas no mercado.

Planos de Saúde Sem Cobertura e Superlotação do SUS

Outro ponto, é que sabemos que quando uma pessoa que possui um plano de saúde e tem negada alguma cobertura, naturalmente tal pessoa busca acesso via SUS.

Contudo, são 50 milhões de pessoas que mantém plano de saúde no país, o que equivale a praticamente ¼ (um quarto) da população brasileira e no caminho que estamos, as pessoas que possuem planos, caso não tenham acesso, buscarão o SUS ocasionando a superlotação e dificultando o acesso para a população mais pobre e carente, quando na verdade a Constituição Federal determina que os planos de saúde devem cumprir com suas obrigações e atender seus beneficiários.

Vou te explicar: a Constituição Federal de 1988, traz consigo o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, bem como preconiza que são direitos e garantias fundamentais o direito à vida e direito à saúde.

Além disso, a Carta Magna elevou o Direito do Consumidor a um status de Direito Fundamental. É aquilo que a doutrina considerou como a Constitucionalização de um Direito Privado.

Sobre o tema, o Professor Fabrício Bolzan de Almeida ensina:

“E não é muito dizer que a Constituição Federal, além de positivar o Princípio da Função Social da Propriedade, também objetivou ampliar seu alcance para albergar a Função Social do Contrato, numa verdadeira Constitucionalização do Direito Privado. Por óbvio, o objetivo do constituinte neste aspecto foi tornar mais justas as relações jurídicas entre particulares”. (Fabrício Bolzan de Almeida in Direito do Consumidor Esquematizado. São Paulo: Saraiva Jur, 2023).

Assim, quando se fala em defesa do consumidor, na realidade estamos falando do direito à vida, do direito à saúde, do direito a ser tratado de forma digna pelos fornecedores no mercado de consumo, o que também é defendido pelo Professor Nelson Nery:

O contrato estará conformado à sua função social quando as partes se pautarem pelos valores da solidariedade (CF, art. 3º, I) e da justiça social (CF, art. 170 caput), da livre-iniciativa, for respeitada a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), não se ferirem valores ambientais (CDC, 51, XIV) etc.” (Nelson Nery Junior in Código Civil Anotado e Legislação Extravagante. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, página 336)

O Professor Nelson Nery aponta situações de inobservância da função social do contrato mencionando que ela ocorrerá sempre que: 1) a prestação de uma das partes for exagerada ou desproporcional, extrapolando a álea normal do contrato; 2) quando houver vantagem exagerada para uma das partes; 3) quando quebrar-se a base objetiva ou subjetiva do contrato.

Por isso, o CDC em seu artigo 6º, preconiza que são direitos básicos, dentre outros:

Dos Direitos Básicos do Consumidor

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

Desse modo, entendemos que a saúde é um serviço público de prestação obrigatória pelo Estado e quando uma a operadora de saúde privada aceita prestar esse serviço (que não é de graça),  em razão da constitucionalização de um direito privado, o dever fornecer saúde ao consumidor, neste caso é e sempre será da operadora de saúde.

Assim é evidente que dentre tantas regulamentações, a Agência se concentra somente em temas que favorecem grandes empresas e operadoras de saúde, as quais nadam de braçada em um mercado restrito e sem competição.

Seguiremos na luta pelo direito dos consumidores e em busca de uma mobilização contra as pautas que favorecem operadoras em detrimento de consumidores os quais já tiveram direitos e garantias reduzidos ao longo dos anos. Dizemos “não” à consulta pública e resolução que trata do SANDBOX.

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Fontes:

https://www.gov.br/ans/pt-br/assuntos/noticias/sociedade/ans-institui-camara-tecnica-sobre-sandbox-regulatorio

https://www.gov.br/ans/pt-br/assuntos/noticias/sobre-ans/justica-valida-ato-da-ans-e-mantem-sandbox-regulatorio

Sinagências

Arquivo:

Ranciaro Assessoria Jurídica

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